sábado, 17 de outubro de 2009

Notícia: A joia do semiárido baiano

Preste bem atenção nesta noz no meio da página porque você ainda vai ouvir falar muito dela. Com textura naturalmente crocante e sabor intenso (de coco, com um toque acentuado de castanha), está dando sinal de que vai logo entrar na moda, pelo menos na alta gastronomia. Não faltam atributos a esse coquinho de apenas 1,5 cm chamado licuri, mas conhecido também como ouricuri, aricuri e pelo menos lisonjeiro apelido de coquinho-cabeçudo.

Ele é bem versátil e prestativo. Fica bom doce ou salgado, verde ou maduro. Dele se fazem leite e farinha. E da noz se extrai um azeite muito perfumado, que serve tanto como ingrediente quanto para finalizar saladas, pratos e doces.
O licuri é um coquinho nativo do semiárido baiano – encontrado também no norte de Minas Gerais, Alagoas e em Pernambuco.
Do alto dos quase dez metros da palmeira Syagrus coronata, conhecida como palmeira solitária, pendem cachos com cerca de 1.400 coquinhos. Uma árvore sustenta, de uma vez, até oito cachos.
Sua polpa amarela, rica em cálcio, rende saborosas geleias, sorvetes e doces, e pode ser apreciada in natura (mas nesse caso, você vai ter de disputá-la com o gado e a ararinha azul, que também adoram).
O coquinho tem outra particularidade culinária: é o lugar escolhido por besouros de vários tipos para depositar seus ovos. Resultado, as larvas crescem ali dentro, se alimentam exclusivamente da noz, e, quando estão gordinhas e transbordando de sabor, vão parar na panela – na foto ao lado elas estão cozidas, prontas para comer. Se tiver oportunidade de provar, não hesite: são consideradas uma iguaria.
Há muito tempo com grande presença no dia a dia de cidades da Bahia como Caldeirão Grande, um dos grandes produtores, e Capim Grosso, só agora o licuri começou a ser explorado pelos chefs baianos. E em pouco tempo está virando estrela.
Paladar resolveu testar o potencial gastronômico dessa amêndoa tipicamente brasileira. Pediu aos chefs Pascal Valero, Mara Salles, Felipe Ribenboim e Gabriel Broide e à chocolatière Sara Accioly para criarem receitas usando o ingrediente, especialmente para esta edição. O resultado você confere abaixo.

1 | Como a castanha, a polpa do licuri tem sabor intenso. É usada no preparo de doces. O coco é colhido na árvore, mas a castanha pode ser catada no pasto: o gado come a polpa e expele o caroço. A noz é protegida pela casca.
2 | Com sabor e textura marcantes, a amêndoa do licuri é rica em óleo e minerais. Pode ser consumida verde ou madura. Na cozinha, presta-se ao preparo de pratos doces e salgados.
3 | Quem vive próximo dos licureiros costuma dizer que do licuri tudo se aproveita – incluindo a casca, usada em artesanato.



4 | A larva é feinha e tem gosto de coco, ou melhor, de licuri. Dependendo da região, ganha um nome: morotó, fofó, boró, bicho-do-coco, tapuru... Essas da foto são receita da nutricionista Neide Rigo, do blog Come-se. Ela jogou as larvas vivas na frigideira (não precisa de azeite, elas soltam óleo), temperou com flor de sal e só.

MAIS ANTIGO QUE O BRASIL
O licurizeiro dá coquinho antes mesmo de o Brasil ser Brasil. O Tratado Descritivo do Brasil, do pesquisador português Gabriel Soares de Sousa, publicado em 1587, fala do sabor e das características do licuri. No fim da década de 1930, o agrônomo russo Gregor Bondar fez um amplo estudo sobre o ingrediente. Há pouco tempo, o licuri virou alvo de uma polêmica, quando a baiana doutora em química Djane Santiago de Jesus, do Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia da Bahia (Ifba), entrou com pedido de patentes de receitas com o produto. As patentes ainda não foram aprovadas – o processo leva anos e pode ser contestado por qualquer pessoa. Em entrevista ao Paladar, ela disse que seu objetivo é "proteger o ingrediente de predadores internacionais".
DA BAHIA, PARA TODO O PAÍS
O licuri usado nas receitas preparadas para esta edição do Paladar foi comprado da Coopes (Cooperativa de Produção da Região do Piemonte da Diamantina), na Bahia. Criada em 2005, a cooperativa fica em Capim Grosso, cidade de 30 mil habitantes a 280 km de Salvador, onde a cultura de licuri e mandioca predominam.
A Coopes faz o beneficiamento e vende o licuri verde, torrado, com sal, acaramelado e o aromático azeite de licuri. A cooperativa envia para todo o país mediante encomenda feita pelo site www.coopes.org.br. ou pelo telefone (74) 3651-0225.
Fotos: Alex Silva/AE

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