sexta-feira, 11 de dezembro de 2009

Notícias: Chefs, doceiras e grandes empresas criam receitas secretas


LUIZA FECAROTTA
da Folha de S.Paulo
Em uma das histórias em quadrinhos de Mauricio de Sousa, Magali tinha o dom de identificar os ingredientes de qualquer receita. Foi então que cientistas sequestraram a garo tinha para que ela desvendasse a secreta fórmula da Coca-Cola. A comilona tentou driblar a situação, mas depois declarou: açúcar mascavo, pitanga, óleo de fígado de bacalhau, sal de frutas, extrato de jiló... Tudo mentira. E a fórmula desse re frigerante, que surgiu em 1886 em uma farmácia em Atlanta (EUA), permaneceu o segredo industrial mais bem guardado do mundo --mesmo presente em mais de 200 países.
Na semana passada, uma ação que envolvia cópia de re ceitas foi resolvida no Tribunal de Justiça de São Paulo. O res taurante Antiquarius acusou o A Bela Sintra, dois famosos lu sitanos da cidade, por plágio de pratos. Em resposta, o tribunal decidiu que não existe proprie dade intelectual de receitas de culinária típica, consideradas de domínio público.
Divulgação
O Melhor Bolo de Chocolate do Mundo, em São Paulo, agora serve o Bolo Zero, versão sem açúcar, que contém 20% menos calorias
Somente os três sócios da empresa O Melhor Bolo de Chocolate do Mundo sabem como fazer o bolo, criado há 20 anos em Lisboa
Talvez por medo de cópias, guardar receitas a sete chaves tenha virado mania. E como mantê-las escondidas? A Bau ducco, que pretende bater re corde de vendas neste ano e atingir a marca de 50 milhões panetones, tem rígida política de privacidade para resguardar a fórmula do bolo natalino.
"A massa madre foi trazida da Itália pelo fundador da mar ca, em 1952", diz Rodrigo Mai­nieri, 32, gerente de marketing. Desde então, é o mesmo pro cesso de fermentação natural que dá origem aos panetones. "Cada fábrica tem uma sala dos bebês, onde ficam as mas­sas que são alimentadas e se multiplicam durante o ano. Quando cresce, a massa é corta da e separada para entrar no processo industrial."
Todos os funcionários envol vidos na produção têm um ter mo de privacidade assinado com a companhia. Mas quem de fato tem acesso à receita é um grupo pequeno. Existe a possibilidade de a re ceita sair dos domínios da Bau ducco? "Sempre existe, mas a questão que fica é: não basta ter a informação, tem de saber fa zer. Até hoje, o senhor Bauduc co faz provas na linha de produ ção para testar a qualidade do que está sendo feito."
Em empresas menores, o procedimento é semelhante. Celina Dias, que trouxe O Me lhor Bolo de Chocolate do Mundo ao Brasil, não arreda pé: todos os dias comparece à cozi nha central. Somente os três sócios sa bem como fazer o bolo, criado há 20 anos em Lisboa. "Ne nhum funcionário conhece a receita inteira. Cada um sabe uma etapa da produção e todos têm um contrato de sigilo", afirma Celina. O processo de produção é segmentado, dividi do em salas diferentes, para que a fórmula do doce se man tenha em segredo.
De uma cozinha centraliza da, com capacidade para pro duzir 600 bolos por dia, saem os doces distribuídos para as franquias, que estão em expan são. A marca acaba de abrir um quiosque no shopping Higienó polis, ganhou um ponto de re venda em Recife e deve chegar, em breve, ao Rio de Janeiro, a Belo Horizonte, a Salvador e a Brasília.
No L'Entrecôte de Ma Tante, primeiro restaurante do padei ro Olivier Anquier, que serve apenas um prato, o segredo é o molho da carne. "Nosso menu tem um preparo simples. O que ninguém sabe fazer é o molho da minha tia Nicole. Fiquei em Paris trancafiado na cozinha dela para aprender a reprodu zir", conta Anquier. "São mais de 30 ingredientes. Só posso fa lar duas coisas: não tem farinha nem creme de leite."
Na tentativa de fazer da casa-mãe um modelo para outras unidades, Olivier se preparou para resguardar a receita de fa mília, que "nunca vai ser trans mitida a ninguém, a não ser ao meu filho", diz ele. Montou uma cozinha-laboratório dedi cada ao preparo do molho, cuja fórmula secreta só ele e um de seus sócios conhecem.
É de lá que o complemento do entrecôte deve sair para as demais casas. Segundo An quier, a técnica de armazena mento ainda está sendo desen volvida e, só depois, a casa po derá ganhar outras unidades.
Empresa familiar
Renata Saboia, dona da sor veteria carioca Mil Frutas ao la do de suas duas filhas, tem a mesma preocupação: manter a qualidade e o sigilo das receitas de seus gelados. Para isso, sua produção também está concen trada em uma pequena fábrica no Rio e abastece oito lojas por lá e duas em São Paulo.
"Acabamos de abrir uma no shopping Iguatemi, e a ideia é continuar mandando sorvetes a São Paulo. Mas nada me im pede de, no futuro, fazer uma pequena fábrica aí", conta. Para driblar o problema das cópias, que a deixa "revoltada", abre suas receitas a apenas três funcionários de sua confiança.
Outro artifício é a alteração constante no processo de pro dução para sempre tornar os resultados melhores. Mais es peciais são as receitas de famí lia: "Temos um sorvete de pavê de chocolate que está na família há mais de 150 anos. Veio da França e minha bisavó já fazia".

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